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Em Hiroshima, busca por restos mortais mantém guerra viva para um único voluntário

Em Hiroshima, busca por restos mortais mantém guerra viva para um único voluntário

Reuters

08/07/2025

Placeholder - loading - Rebun Kayo na ilha de Ninoshima   5/7/2025   REUTERS/Kim Kyung-Hoon
Rebun Kayo na ilha de Ninoshima 5/7/2025 REUTERS/Kim Kyung-Hoon

Por Kim Kyung-Hoon e Tom Bateman

NINOSHIMA, Japão (Reuters) - Dezenas de vezes por ano, Rebun Kayo pega uma balsa para uma pequena ilha em frente ao porto de Hiroshima em busca dos restos mortais de pessoas mortas pela bomba atômica há 80 anos.

Para o pesquisador de 47 anos, desenterrar até mesmo os menores fragmentos na ilha de Ninoshima é um lembrete preocupante de que a guerra é uma realidade que persiste -- enterrada, esquecida e não resolvida.

'Quando morremos, somos enterrados em lugares como templos ou igrejas e nos despedimos em uma cerimônia. Essa é a maneira digna de sermos despedidos', disse Kayo, pesquisador do Centro para a Paz da Universidade de Hiroshima, que dedica seu próprio tempo e dinheiro às escavações.

Depois que os Estados Unidos lançaram a bomba atômica sobre Hiroshima em 6 de agosto de 1945, matando instantaneamente cerca de 78.000 pessoas e ferindo muito mais, Ninoshima, a cerca de 4 km do hipocentro, tornou-se um hospital de campanha. Em poucas semanas, cerca de 10.000 vítimas, vivas e mortas, foram transportadas pela água. Muitas morreram logo depois e, quando as cremações não puderam ser realizadas, as pessoas foram enterradas em valas comuns.

Embora muitos restos mortais tenham sido desenterrados nas décadas seguintes à guerra, relatos de testemunhas sugerem que havia mais locais de sepultamento. O filho de um morador informou Kayo sobre uma área na costa noroeste da ilha em 2014 e, a partir daí, ele juntou recursos e começou a cavar quatro anos depois.

CRUELDADE

No calor escaldante do último fim de semana, Kayo cortou o mato para voltar ao local onde havia parado três semanas antes. Depois de uma hora e meia de escavação, ele retirou cuidadosamente da terra dois fragmentos de ossos do tamanho de uma unha do polegar, que se somaram aos cerca de 100 que ele já havia desenterrado até então.

Cada descoberta lhe traz à mente a crueldade da guerra. A dor nunca foi tão intensa como quando Kayo encontrou pedaços da mandíbula e do dente de uma criança pequena no início deste ano, disse ele.

'Isso me atingiu com muita força', declarou Kayo, com a camisa branca de manga comprida encharcada de suor. 'Aquela criança foi morta por uma bomba, sem saber nada sobre o mundo... Não consegui me conformar com isso por um tempo, e esse sentimento ainda persiste.'

Um dia, ele planeja levar todos os fragmentos para um templo budista, onde poderão ser guardados.

A motivação de Kayo para repetir a árdua tarefa ano após ano é em parte pessoal.

Nascido em Okinawa, onde foram travadas algumas das batalhas mais sangrentas durante a Segunda Guerra Mundial, Kayo tem três parentes cujos restos mortais nunca foram encontrados.

Voluntários de todo o Japão ainda chegam a Okinawa para escavações e, como a hera venenosa nas florestas de lá é proibitiva para ele, Kayo retribui o favor em Ninoshima.

Enquanto os vestígios dos mortos continuarem aparecendo, a proximidade da guerra é palpável para Kayo.

'Hoje em dia, as pessoas que não sabem sobre a guerra se concentram apenas na recuperação e levam a conversa adiante, esquecendo-se dessas pessoas aqui', disse ele.

'E, no final, haverá pessoas dizendo: 'mesmo que você jogue uma bomba atômica, você pode se recuperar'... Sempre haverá pessoas que tentarão justificar isso da maneira que lhes convém.'

Reuters

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