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EXCLUSIVO-Governo Assad moveu secretamente vala comum para encobrir assassinatos, revela Reuters

EXCLUSIVO-Governo Assad moveu secretamente vala comum para encobrir assassinatos, revela Reuters

Reuters

14/10/2025

Placeholder - loading - Visão aérea de marcas deixadas por escavadeiras no solo sobre vala comum no deserto oriental da Síria  27/02/2025 REUTERS/Khalil Ashawi
Visão aérea de marcas deixadas por escavadeiras no solo sobre vala comum no deserto oriental da Síria 27/02/2025 REUTERS/Khalil Ashawi

Atualizada em  14/10/2025

Por Maggie Michael e Feras Dalatey e Ryan McNeill e Khalil Ashawi

DHUMAIR, Síria - O governo de Assad realizou uma operação clandestina de dois anos para transportar milhares de corpos de uma das maiores valas comuns conhecidas da Síria para um local secreto a mais de uma hora de distância no deserto remoto, mostrou uma investigação conduzida pela Reuters.

A conspiração do Exército do presidente Bashar al-Assad para escavar a vala comum em Qutayfah e criar uma segunda vala comum gigantesca no deserto, nos arredores da cidade de Dhumair, ainda não havia sido reportada.

Para descobrir a localização da vala de Dhumair e detalhar a vasta operação, a Reuters conversou com 13 pessoas com conhecimento direto do esforço de dois anos para transportar os corpos, analisou documentos produzidos por funcionários envolvidos e analisou centenas de imagens de satélite de ambos os locais de sepultamento tiradas ao longo de anos.

A operação de transferência de corpos de Qutayfah para local secreto a dezenas de quilômetros de distância foi chamada de 'Operação Move Earth' e durou de 2019 a 2021. O objetivo era encobrir crimes do governo de Assad e ajudar a restaurar sua imagem, disseram as testemunhas.

A Reuters informou o governo do presidente Ahmed al-Sharaa sobre as conclusões dessa investigação nesta terça-feira. O governo não respondeu imediatamente às perguntas desta reportagem.

A agência de notícias não está revelando a localização exata do local, para reduzir a probabilidade de interferência na sepultura. Uma próxima reportagem especial da Reuters vai detalhar como o governo de Assad executou a operação clandestina e como os jornalistas descobriram o esquema.

Com pelo menos 34 trincheiras medindo 2 quilômetros de comprimento, a sepultura no deserto de Dhumair está entre as mais extensas criadas durante a guerra civil síria, segundo a Reuters. Relatos de testemunhas e as dimensões do novo local sugerem que dezenas de milhares de pessoas podem estar sepultadas ali.

O governo de Assad começou a enterrar os mortos em Qutayfah por volta de 2012, no início da guerra civil. A vala comum continha os corpos de soldados e prisioneiros que morreram nas prisões e hospitais militares do ditador, disseram as testemunhas.

Um ativista sírio de direitos humanos expôs Qutayfah ao divulgar fotos para a mídia local em 2014, revelando a existência da vala e sua localização aproximada nos arredores de Damasco. A localização exata veio à tona alguns anos depois, em testemunhos judiciais e reportagens.

Durante quatro noites, quase todas as semanas, de fevereiro de 2019 a abril de 2021, seis a oito caminhões cheios de terra e restos humanos viajaram de Qutayfah para o deserto de Dhumair, segundo testemunhas envolvidas na operação. A Reuters não pôde confirmar se corpos de outras áreas foram levados ao local secreto e não encontrou documentação mencionando a Operação Move Earth ou valas comuns em geral.

Todos os envolvidos diretamente se lembram vividamente do mau cheiro, incluindo dois caminhoneiros, três mecânicos, um operador de escavadeira e um ex-oficial da Guarda Republicana de elite de Assad que esteve envolvido desde os primeiros dias da transferência.

O ex-presidente Assad, que está na Rússia, e vários oficiais militares identificados por testemunhas como tendo desempenhado papéis importantes na operação não puderam ser contatados para comentar o assunto. Após a queda da ditadura no final do ano passado, Assad e muitos de seus assessores fugiram do país.

A ideia de mover milhares de corpos surgiu no final de 2018, quando Assad estava prestes a vencer a guerra civil da Síria, disse o ex-oficial da Guarda Republicana. O ditador esperava recuperar o reconhecimento internacional após ser marginalizado por anos de sanções e alegações de brutalidade, disse o oficial.

Na época, Assad já havia sido acusado de deter milhares de sírios. Mas nenhum grupo sírio independente ou organização internacional teve acesso às prisões ou às valas comuns.

Dois caminhoneiros e o oficial disseram à Reuters que foram informados por comandantes militares que o objetivo da transferência era limpar a vala comum de Qutayfah e esconder evidências de assassinatos em massa.

Quando Assad caiu, todas as 16 trincheiras documentadas em Qutayfah pela Reuters haviam sido esvaziadas.

Mais de 160.000 pessoas desapareceram no vasto aparato de segurança do ditador deposto e acredita-se que estejam enterradas nas dezenas de valas comuns criadas por ele, segundo grupos de direitos humanos sírios. Uma escavação organizada e a análise de DNA poderiam ajudar a rastrear o que aconteceu com elas, aliviando uma das feridas mais dolorosas da Síria.

Porém, com poucos recursos na Síria, até mesmo as valas comuns bem conhecidas estão em grande parte desprotegidas e sem escavação. E os novos líderes do país, que derrubaram Assad em dezembro, não liberaram qualquer documentação sobre os indivíduos enterrados nelas, apesar dos repetidos apelos das famílias dos desaparecidos.

Mohammed Reda Jehlki, chefe da Comissão Nacional para Pessoas Desaparecidas do governo, disse que o grande número de vítimas e a necessidade de reconstruir o sistema judiciário dificultam o trabalho. Ele anunciou planos para criar um banco de DNA e uma plataforma digital centralizada para as famílias dos desaparecidos, e destacou a necessidade urgente de treinar especialistas em medicina forense e testes de DNA.

'Há uma ferida sangrando enquanto houver mães esperando para encontrar os túmulos de seus filhos, esposas esperando para encontrar os túmulos de seus maridos e crianças esperando para encontrar os túmulos de seus pais', disse ele ao site de notícias semi-oficial sírio al-Watan no final de agosto.

Mohamed Al Abdallah, diretor do Syria Justice and Accountability Center, organização síria que trabalha para rastrear os desaparecidos e investigar crimes de guerra, disse que uma transferência aleatória de corpos como a de Qutayfah para Dhumair foi desastrosa para as famílias em luto.

'Juntar esses corpos para que os restos mortais completos possam ser devolvidos às famílias será extremamente complicado', disse Al Abdallah após tomar conhecimento das descobertas da Reuters. Ele descreveu a criação da comissão para pessoas desaparecidas como um passo positivo do novo governo.

'Ela tem apoio político, mas ainda carece de recursos e de especialistas', avaliou.

Motoristas, mecânicos e outros envolvidos na transferência disseram que falar na época da operação secreta significava morte certa.

'Ninguém desobedeceria às ordens', disse um motorista. 'Você mesmo pode acabar nos buracos.'

(Reportagem de Maggie Michael, Feras Dalatey e Khalil Ashawi em Dhumair, Síria, e Ryan McNeil em Londres)

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