VINIL EM ALTA: NOSTALGIA, QUALIDADE OU MODISMO?
O QUE HÁ POR TRÁS DESSE FENÔMENO COMERCIAL — E, AFINAL, O SOM DO VINIL É REALMENTE MELHOR QUE O DIGITAL?
João Carlos
23/05/2025
Nos últimos anos, o vinil voltou a ganhar destaque no mercado musical, surpreendendo fãs, colecionadores e a indústria fonográfica. Com lançamentos recentes de grandes nomes do pop e um crescimento consistente nas vendas, o fenômeno desperta curiosidade: seria apenas uma onda nostálgica ou há algo mais por trás desse retorno triunfal? Nesta matéria, exploramos as razões desse renascimento e o eterno debate sobre a qualidade do som.
Lado A: o retorno triunfal do vinil

Com cada vez mais artistas relançando clássicos e apostando em edições especiais, o vinil voltou a ser protagonista na indústria fonográfica. Na última semana, Mariah Carey anunciou uma nova edição comemorativa de The Emancipation of Mimi em vinil, enquanto Robbie Williams confirmou o lançamento de seu novo álbum Britpop em diversos formatos, incluindo vinil e fita cassete. Essas novidades somam-se a uma tendência clara: o formato que já foi dado como obsoleto está mais valorizado do que nunca.
Impulsionadas por grandes nomes do pop como Taylor Swift — que bateu recordes de vendas com versões exclusivas de seus álbuns em vinil — as prensagens se tornaram objeto de desejo não apenas entre colecionadores, mas também entre jovens ouvintes. O sucesso crescente do Record Store Day também ajuda a explicar esse fenômeno.
Criado em 2007 nos Estados Unidos, o evento anual celebra as lojas de discos independentes com lançamentos exclusivos e shows especiais. Celebridades, artistas e selos fonográficos participam ativamente da programação, transformando o dia em um acontecimento global. Em 2024, o Record Store Day registrou seu maior volume de vendas desde a criação.
Esse crescimento tem chamado a atenção de executivos da indústria. Em entrevista ao Music Week, Jo Charrington, presidente da Capitol Records UK, destacou:
"O retorno do vinil não é apenas uma tendência nostálgica; ele representa uma nova forma de conexão entre artistas e fãs. As edições especiais e limitadas criam uma experiência tangível que o streaming não pode oferecer."
A perspectiva também se confirma no mercado brasileiro. Rafael Cortes, sócio e A&R da gravadora Rocinante, afirmou:
"O mercado de vinil no Brasil está mais forte do que nunca. Lançar vinil no Brasil nunca foi tão promissor."
Lado B: a era de ouro e a queda do vinil

Muito antes de se tornar objeto de desejo nas feiras de colecionadores e vitrines de lojas especializadas, o vinil foi o principal alicerce da indústria fonográfica por décadas. A partir dos anos 1950, os discos dominaram o mercado mundial, substituindo os antigos 78 rotações e oferecendo mais tempo de reprodução, melhor qualidade de som e maior resistência.
Durante as décadas de 1960, 70 e 80, o formato reinou absoluto. Capas icônicas, encartes elaborados e a prática de ouvir um álbum completo moldaram hábitos culturais em torno da música. Um marco dessa era foi o álbum Thriller, de Michael Jackson (na foto acima), que se tornou o disco mais vendido da história com mais de 70 milhões de cópias comercializadas — grande parte delas em vinil. Entre as artistas femininas, Madonna se destacou com Like a Virgin, lançado em 1984, que também obteve vendas expressivas no formato.
No entanto, com a chegada das fitas cassete e, posteriormente, do CD, o vinil perdeu espaço nas prateleiras e no gosto do público.
Nos anos 2000, com o advento dos arquivos digitais e do streaming, o formato analógico foi relegado a nichos. Aparentemente, sua história havia sido encerrada. Mas como um bom lado B escondido em discos clássicos, o vinil ressurgiu com força surpreendente.
Agulha na polêmica: o som do vinil é mesmo melhor?

Entre os audiófilos, há um consenso quase emocional: o som do vinil seria mais rico, encorpado e natural. Eles defendem que, por ser um formato analógico, o vinil reproduz as ondas sonoras de forma mais fidedigna ao original.
Mas especialistas, engenheiros de som e físicos apontam que essa não é uma verdade absoluta. O vinil está sujeito a ruídos, variações de velocidade e perdas de frequência. Sua qualidade depende de muitos fatores: desde a prensagem até o equipamento utilizado. Além disso, boa parte dos discos atuais é produzida a partir de arquivos digitais.
Paul D. Lehrman, especialista em engenharia de áudio da Tufts University, afirma:
“Por qualquer critério mensurável, os CDs são superiores aos LPs. E também o são os arquivos MP3 e AAC com taxas de bits acima de 300k, que na maioria dos casos são indistinguíveis dos CDs.”
Por outro lado, o vinil entrega uma sonoridade que agrada aos ouvidos humanos de forma subjetiva. O leve chiado de fundo, as imperfeições e a dinâmica do som criam uma experiência emocionalmente mais envolvente para muitos ouvintes.
Como exemplo dessa visão apaixonada, o audiófilo e colecionador John M., de Nova York, compartilha:
“O vinil tem uma profundidade e calor que o digital simplesmente não consegue replicar. Para mim, não é só sobre a qualidade técnica, mas sobre sentir a música de uma forma mais viva e autêntica. Cada estalo e chiado fazem parte da experiência.”
Mais que música: identidade e mercado

Independentemente do eterno debate sobre a superioridade sonora entre o analógico e o digital, o renascimento do vinil revela muito mais sobre comportamento do que sobre tecnologia. O aumento expressivo nas vendas e a decisão da indústria de apostar novamente em lançamentos físicos em larga escala são reflexos de um mosaico de fatores: nostalgia, valorização do objeto físico, tendências estéticas, desejo de exclusividade e interesses comerciais.
Para os mais jovens, o vinil é moda e identidade. Para os veteranos, é um reencontro com o passado. E para a indústria, uma nova oportunidade de gerar receita num mercado saturado por streaming.
Se o vinil vai manter esse fôlego nos próximos anos, só o tempo dirá. Mas uma coisa é certa: seja por paixão, estilo ou estratégia, a agulha voltou a tocar — e, ao que tudo indica, ainda tem muitos giros pela frente.
Observação: alguns depoimentos incluídos nesta matéria foram extraídos de fóruns de discussão na internet, refletindo vozes reais de fãs e consumidores do vinil.